quinta-feira, 17 de dezembro de 2015

As trevas



Aquele ia ser um dia bastante atarefado. De dia, ele ia trabalhar nas obras de um muro num parque. De noite, tinha um compromisso agendado: reencontro com uma amiga dos tempos de colégio.

Chegou ao parque bem cedo, como se estar lá antes do início do expediente fosse agilizar o trabalho. A noite passada tinha sido tranquila, mas ele se sentiu muito cansado, quase com dificuldade de fazer alguns movimentos com as mãos. Estranhou essas condições, mas preferiu pensar que era apenas uma casualidade, reflexão escapista, mas que pôde deixá-lo confortável durante o período necessário para terminar o que tinha para ser feito.

Chegou a casa e conferiu seu relógio, Faltavam 20 minutos para seu compromisso. Desconhecia o endereço do local marcado, mas queria muito vê-la. Não parecia muito distante, então, decidiu ir a pé. Foi uma experiência incomum, as ruas em que andava eram familiares, mas tão escuras que pareciam capazes de engoli-lo por inteiro. Por um instante, torceu para que isso pudesse acontecer, pois assim poderia livrar-se da realidade que o amedrontava.

Chegou ao local combinado e começou a ouvir ruídos. As luzes se apagaram aos poucos, e o medo começou a apossar-se dele. Era um clima tenso; a cidade grande era agora um reduto de trevas. Cenas inacreditáveis começaram a rodar em sua mente: olhares de pessoas conhecidas esbanjavam algo muito ruim, como expressões que não conseguia decifrar, mas que mostravam que coisas medonhas estariam por vir.

Muitas vozes murmuraram que ele possuía algo de raro e poderoso e que não tinha conhecimento do que abrigava. Ele se assustou e teve vontade de falar, mas as palavras fugiram. Começou a correr como um desesperado; a distância até sua casa não passava de trezentos metros, mas a atmosfera fez o caminho parecer infinito. Encontrou sua velha amiga no chão. Não conseguiu sentir se ela respirava ou não, apenas percebeu que sua camisa estava com uma mancha de sangue crescendo.

Ele cerrou os dentes, tentou respirar normalmente e a agarrou nos braços. O ar tremulou e tudo ecoou nele. Todos os seus pesadelos pairavam ao seu redor. Aqueles momentos agoniantes de correria, pedindo que alguém escutasse sua voz, o torturavam, como se um fim estivesse bem próximo. Toda a angústia o fez prestar atenção em sua alma, tirando um foto mental dela. Quando a viu, colocou fim às sombras e excluiu uma energia de outro mundo. Passaram-se dez minutos e as calçadas voltaram ao normal, permitindo que ele caísse e ficasse desmaiado até compreender o que aconteceu.

Zeca Lemos




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