sexta-feira, 13 de fevereiro de 2015

Espelho de um devaneio



Histórias todos têm, momentos todos vivem, lembranças todos possuem. O que diferencia os indivíduos é a forma como direcionam esses fenômenos. O plano sequencial proposto pela cultura ocidental é demasiadamente conservador. Para alguns, isso é sinônimo de tranquilidade, para outros significa falta de inovação.

Sempre procurei conceber que cada um reinventa o que acontece à sua maneira. A rigor, isso é bastante tranquilo, só é preciso manter pensamentos progressistas com boa frequência, mas na prática só executa isso quem está determinado.

O mais agradável que pode existir na vida de um homem é aquela coisa que o balança, que suspende o pensamento lúcido por alguns instantes. Porque todos sentem emoções significativas e pensam vorazmente, mas é raro ver alguém que faz seu cotidiano condizer com isso, passar sinceridade e pureza. Dias tão belos são aqueles em que nos emocionamos, em que sentimos nostalgia de todas as coisas que não aconteceram; em que fazemos conjecturas que exprimem no peito dores sublimes.

A doce sombra da solidão suprema enriquece os homens, trazendo sensações que eles nem sequer imaginavam existir, ao som de um brado vibrante, imaginando uma senda de glórias infindáveis.

Ela foi-se embora há cerca de 29 anos. Desde então, sua feição não aparece mais na casa. Só uma fotografia desgastada restou. Um produto tão antigo e tão valoroso! Ás vezes olhava fixamente para ela no ápice do cheiro da noite. Ficava horas examinando aquele retrato, sempre captando algum elemento novo que o fazia conhecê-la melhor.

Morria de felicidade, a ponto de acreditar que a garota ainda iria voltar. Um sentimento que lembrava um delírio ficcional, com chance de realidade. Tão verdadeira era essa crença, que todo dia ia ao mesmo canto da sala ,onde a viu pela última vez, para esperá-la. Estava tão sozinho como em uma prisão, mas se sentia acompanhado por milhões de pensamentos.

Ia dormir para sonhar que ela chegara e que fugiria para a Suécia com ela, mas esse falso devaneio só durava algumas horas. Ao amanhecer, chorava ao constatar que tudo só se passava na sua imaginação!

Zeca Lemos

domingo, 8 de fevereiro de 2015

Nas profundidades do meu mar interior



É difícil expressar o que eu estou sentindo. Sempre me achei uma pessoa um pouco incongruente por dentro. Procuro passar o que tenho de mais bonito, mas meu estado espiritual quase nunca faz jus a essa beleza.

Todos os dias vou aos mesmos lugares, converso com as mesmas pessoas. É até um pouco difícil expressar minha gratidão por ter essa rotina, mas existe algo faltando. O dia sempre termina em um monólogo para encontrar o significado desse vazio.

A repetitividade do meu cotidiano me entristece. Chega um momento que cansa sempre fazer o que já foi testado. Como eu queria me aventurar de maneira promíscua, conseguir orgulhar-me do que eu sou, acordar sorrindo sem motivo!

Lá no fundo estou em constante duelo, travando uma batalha com a escuridão que criei. Toda noite meus demônios são expelidos pela beleza do luar, mas ao amanhecer eles estão de volta. Isso é tão fenomenal, mas tão dilacerante! De tanto pensar, acabei subvertendo a emoção de perder-me no abismo infinito que meu sofrimento constitui.

Já não me atordoo mais em pensar que isso um dia vai ter fim. A sensação que minhas tardes sempre serão tomadas por melancolia se tornou normal. Sempre gostei muito de imaginar minha vida num pano de fundo azul. Uma cor tão bela e diversificada, que sintetiza tudo do que eu quero ser, tudo o que eu sou e também o que eu não sou.

Celeste, anil, turquesa... Tantas variações de uma única cor. O céu, o infinito, tantas manifestações que me fascinam, mas nada como a perfeição do mar; olhar pra ele é sentir como se o amanhã não tivesse que vir. Isso é o que me encanta, me enobrece e me dá prazer por alguns minutos. Não existe nada mais delicioso do que imaginar que eu represento uma estrela na terra que brilha tanto a ponto de iluminar o oceano.

História de uma fusão de sentimentos heterogêneos, monotonia que se mistura com harmonia, frieza que se choca com sentimentalismo; pois meus esforços para lembrar não passam da imensa vontade que eu tenho de esquecer, canalizada de uma forma estranha, condensando tudo o que a vida teve de mais belo a me oferecer.
Acredito que lá nas profundidades do meu mar interior, tudo o que eu tenho é uma fome insaciável. Fome de me satisfazer por completo, fome de vontade de encontrar palavras sólidas, fome de ser importante para alguém. Sei que somente minhas sensações podem fazer de mim o que eu realmente sou.
Zeca Lemos