sábado, 2 de janeiro de 2016

O lúcido e embriagado mistério de viver


Outro dia, li no jornal um artigo sobre insônia. Embora esse assunto seja comum no meu cotidiano, a matéria me fez pensar sobre ela por alguns minutos. Começou quando eu involuntariamente repeti a manchete em voz alta algumas vezes. Não passava de uma frase simples: "insônia pode ser o principal sintoma das preocupações humanas ".

Depois de tanto repetir essa afirmativa, as palavras começaram a me chamar a atenção, como se tivessem algo profundo para me dizer. Pensei em coisas que tangenciavam o tema. Minha mente se tornou um campo de pautas. Eram tópicos que eu não costumava refletir, mas pareciam valer horas de atenção.

De repente, vi-me conjecturando possibilidades de histórias que uma pessoa com insônia poderia escrever; imaginando quais seriam os pensamentos utilizados pelo jornalista que assinou o artigo e pesquisando a etimologia dos vocábulos do texto. Como posso não enlouquecer, transformando essas confusões mentais em sentimentos profundos?

Assim como uma música, um artigo jornalístico tem vida própria. Ele pode trazer infinitas interpretações e penetrar em quaisquer mídias. Eu adoro o inalcançável, porque nele as coisas são mais bonitas. Se eu pudesse, viveria no corpo de um aprendiz eternamente, pois nada me fascina mais do que ter em mente que, por mais que eu cresça, sempre haverá algo para eu aprender. 

Enxergo no conhecimento o brilho de uma menina que vejo passar com marcas deixadas pela sua vida. Passar momentos de crise, tentando saber mais, é uma dádiva que muitas pessoas não sabem saborear. São fontes inesgotáveis de análise e aprendizado. Sei que nunca vou compreender tudo o que as maravilhas da vida têm para me falar. Quando eu era mais novo, achava que brinquedos enigmáticos, como um quebra-cabeça, só serviam para me irritar; hoje vejo os meus mistérios como combustíveis para viver. Afinal, quem vive sem aprender não pode dizer com propriedade que nasceu.

Zeca Lemos


terça-feira, 29 de dezembro de 2015

Lado desequilibrado


Uma coisa que sempre me deslumbra é a face instável de cada pessoa. Vejo o lado desequilibrado dos indivíduos como uma fiel representação do que eles não mostram ao mundo. Eu realmente não entendo por que as situações têm que ficar adversas, para que essa faceta seja externalizada. Se as cenas mais belas dos filmes são as de loucuras, por que não interpretá-las no cotidiano?

Perdi a conta de quantas vezes tive pena de pessoas que não expressaram nada na hora de partir nem no momento de ficar. Quem dera eu pudesse ler o que está escrito na alma de cada um! A maior admiração que tenho é pelas pessoas que choram, sem noção de tempo e medo. Não por acontecimentos específicos, mas pelos fatos que a vida traz como imposição brutal.

As lágrimas daquele que eram para ser e não eram. O reserva do goleiro. Ele tinha seu talento, seu jeito de ser e sua determinação; mas nunca haveria chance para mostrar isso. Para sempre seria o substituto que não precisou ser acionado. Torcer por uma oportunidade era como esperar por um milagre. No fundo, ele sabia que estava clamando por algo que dificilmente iria acontecer.

Há quem sinta, de madrugada, o cenário mudar; quem veja seu interior e sinta uma vontade louca de morar lá. É a ânsia por paz. A idealização de pensar que se pode viver num lugar sem preocupações nem momentos de dor. Quando se cresce o suficiente,  percebe-se que isso seria uma artimanha, seria simples paliativo. A única forma mesmo de enfrentar o que nos corrói por dentro é lutando contra o que nos deixava vivos, mas nos ameaçava diariamente.

Zeca Lemos