sábado, 4 de julho de 2015

Mais um final




Mais um dia de final com a gloriosa Albiceleste. Mais uma página escrita como o final de um capítulo da vida de um torcedor apaixonado pela Argentina. Acordei disposto a assistir a esse jogo e viver mais um pouco do sentimento que preenche a minha alma. Não consigo dizer claramente o que vinha a ser meu pressentimento para a partida, mas acho que estava atrelado a alguma forma de paixão.

A tarde começou com um típico encontro de amigos. Não demorou muito para o jogo começar em Santiago, mas bateu aquela agonia de estar distante do amor, mesmo ele reverberando forte, como se aqueles movimentos estivessem seguros no nada para continuar existindo.

O tempo passava e eu ia perdendo as certezas a respeito do que estava pensando. Uma semana atrás, tinha sonhado com esse jogo. Recordo-me que foi um estranho; assim que eu acordei, tentei vasculhar os arquivos da minha mente para descobrir algo, mas nenhuma informação chegou.

A partida começou. De início não empolgou muito. O primeiro tempo assustou em alguns lances, mas nada que pudesse fazer-me sentir estimulado. O segundo também não parecia revelar nada que tivesse  gosto de vida. O resultado nem interessava, eu só queria algo para mexer lá dentro.

Fechei os olhos com uma piscadela comum; quando os abri, parece que algo no ambiente havia mudado, mas não me interesso muito em decifrar o acontecido. Ainda depois disso, o jogo só começou a ficar interessante nos 15 minutos finais. Algo me dizia que o Chile iria acabar com o meu sonho, mas o contrário se mostrou muito mais viável. Nos últimos momentos, um contra-ataque ia dar o título ao meu estimado esquadrão. Um cruzamento rasteiro veio como se fosse acabar com quase dezessete anos de espera. Levantei-me e já preparava o grito, mas a bola foi para fora.

Minha intuição me dizia que ainda ia realizar-se, mas, independente disso, meu coração pedia para continuar a experiência. A prorrogação passou de uma maneira tão leve, que me dei o direito de chamá-la de "pequena eternidade". Ela terminou, e meu corpo ficou sem saber como reagir.

Pênaltis, o que eles representariam? O começo de uma alegria tão desejada ou mais um adiamento dela? Não me cabe tentar fazer previsão disso, até porque acho que já perdi a noção dos fatos. A disputa começou de maneira equilibrada, cada seleção convertendo os chutes. O segundo já me deixou mais melancólico, o Chile abrindo vantagem. Minha boca já se recusava a tentar juntar palavras em sequência, mas por algum motivo a cabeça a manteve tranquila que a conquista viria.

Na terceira cobrança, o episódio se repetiu, o sonho pareceu impossível e eu quase caí. Realmente, não tenho noção do mosaico que se formou com aquele sofrimento. Só havia mais uma oportunidade, só mais uma olhada para que o caos se instalasse. Cobrança no canto, foi gol do Chile. O país andino ficou com a taça, e eu tive que esperar mais alguns anos para gritar "É campeão", como tinha desejado.

Só o que se sentia era conformidade, é uma amálgama de gritos, berros e um cansaço que me corroía como naquele dia em que eu fui inventar de convencer uma pessoa de que eu sentia amor por ela. A vontade de esbravejar veio, mas uma estrutura no meu peito me dava um conselho "Ei, não fale nada não. Pare de querer encontrar frases no sentido de traduzir o que os teus sentimentos te dão. Respeite a grandeza deles."

Essa frase bateu na minha testa e destruiu minhas forças. Cheguei a pensar que desaprendi a falar sobre tristeza. Depois disso, fui celebrar aquilo que em alguns momentos pareceu transformar-se no tudo. Parei para beber um vinho velho, masquei uma bala quase vencida e comecei a rir de mim e da minha teimosia em querer entender as coisas, como se sensações fossem uma ciência exata. Uma lágrima escorreu do meu olho esquerdo e constatei que a vida é mesmo um negócio lindo, cheia de belezas fragmentadas, ilusões extraordinárias e desejos transcendentes. Chorei sozinho por quase uma hora, mas terminei rindo por achar que no dia seguinte algo poderia mudar.

Zeca Lemos




domingo, 28 de junho de 2015

Nirvana



Eu tinha por volta de sete anos quando comecei a ter contatos com jogos; lembro-me de que um dos primeiros foi de futebol (uma edição do brasileirão 2006, salvo engano). Eu jogava esse "game" todo dia, e ele costumava trazer-me muita raiva por conter vários grosseiros erros de fabricação, mas tinha uma música na trilha sonora que chamava muito a atenção. Era algo que eu não distinguia o vocal nem escutava de fato a letra. Acho que exatamente por ser desconhecido é que me fascinava.

Juro que liberei toda a minha energia para conseguir saber qual era a música, mas não consegui. Fiquei frustrado e pensei nisso toda noite, me vendo predestinado àquele sofrimento. Uns seis anos depois, numa viagem à Canoa Quebrada, minha irmã me alertou que estava tocando a música que tanto me agradava.  Empolguei-me e fiquei atento para escutá-la. Era a canção mesmo! Que emoção, quanta emoção! Foi tão incrível que os meus olhos lacrimejaram. Dois minutos depois, a música terminou. As lágrimas se multiplicaram, mas sua causa tinha mudado. Senti que a felicidade de anos atrás tinha chegado até mim, porém minha força não tinha sido o suficiente para agarrá-la.

Passei quase uma hora chorando, sem explicar a ninguém o motivo. Foi horrível, mas foi uma experiência única. Um momento para escrever um daqueles livros melosos. Olhei com todo o ardor  o sonho, mas não podia vê-lo realizar-se. Quando cheguei a casa, senti vontade de não mais viver.

Mais dois anos de agonia por ter uma paixão faminta, mais meses tendo a vida incompleta... Foi em 2014 que minha irmã me chamou. Digitou algo no youtube, algo do tipo "El Bosco - Nirvana". De início, estranhei demais, mas quando o vídeo rodou, fiquei no chão como se aquilo fosse o céu. Era realmente a tão amada música, estranhamente budista e com um clipe fenomenal. Uma vez vi na rua uma pichação que estampava "Onde fica o seu céu?". Foi ali que constatei que o meu céu não era um lugar, meu céu era uma história. Só me lembro de falar algumas palavras mal pronunciadas e gritar um pouco... aquele som me trouxe melhor lembrança da minha vida.

Zeca Lemos