segunda-feira, 27 de abril de 2015

Ilusão




Durante muito tempo, não gostava de lembrar-se daquilo. Era uma daquelas questões que pareciam não ter saída, uma prisão de ferro. Sem dúvida, aquela amizade já estava desgastada. Muitas fatalidades, balbúrdias e situações sem esclarecimento já tinham afetado bastante o que havia entre eles.

Era uma incongruência repetida; ele se importava de maneira exagerada com tudo o que a envolvia. Por mais que não quisesse, assuntos que se referiam a ela eram causas de noites de mal-estar. As conversas fluíam e os temas até caminhavam, mas nunca da forma como ele imaginava que poderia vir a ser.

Foram pouco mais de seis anos de uma convivência incômoda para ambos. Um escândalo que reverberava nele como socos no estômago todos os dias. Conversas incoerentes, mentiras poéticas, insatisfações constantes eram partes daquela falha estrutural perfeita. Não importava do que era feito o dia, ele sempre terminava com lamentações a respeito de algo que a tinha no meio. Era como uma faísca ecoando em meio a uma musicalidade New Age. Doentio, mas pleno.

Depois de suar tanto sangue na cama, viu que todo aquele sentimento não tinha nada dela. Era exclusivamente dele. Nunca gostou da real pessoa que ela era, apaixonou-se por alguém que sua mente criou, fortificou-se e direcionou-se a ela. Sua imaginação foi tão doente que fez de uma invenção um fato absoluto e verdadeiro. Foi uma peça que seu subconsciente expandiu, alimentando seus instintos mais alienados durante anos. Uma construção que mudou sua perspectiva do mundo.

O mais absurdo de tudo foi que o momento mais completo desse período de dor, choque, sangue e lágrimas foi justamente o dia em que acabou. A hora que tudo trouxe algum nexo foi a de mais desilusão e a mais importante.

Chorou durante alguns meses, porém nada que o prazer de poder pensar não pudesse preencher. Terminou por compreender que o amor realmente é assim: cego, sofrível, incoerente, louco e sórdido. Pois é, não foi dessa vez que a paixão foi real, não foi nessa oportunidade que a ilusão se fez realidade!

Zeca Lemos