segunda-feira, 10 de agosto de 2015

Sobre tabus




Todo mundo passa boa parte de seu tempo cercado de tabus. O conceito dessa palavra é bem confuso. Já escutei alguém que a usava para se referir a um time que não ganha há muitos jogos, outras vezes a ouvi como se fosse algo que nunca aconteceu. Então, fui pesquisar o significado no dicionário e logo veio a explicação: “O significado de tabu geralmente se refere a uma proibição da prática de qualquer atividade social que seja moral, religiosa ou culturalmente reprovável". Vi que não conseguiria encontrar um significado objetivo e resolvi desistir de tentar compreender.

Eu repetia muito essa palavra, porque sentia que ela se aplicava a algumas situações que eu vivia. Sempre achei inútil expressar-me, como se fosse obrigado a fazer outras pessoas me entenderem. Portanto, no mínimo preciso adequar as palavras ao meu estilo de vida. Eu as emprego quando como eu quero; o que os ouvidos alheios entendem não me interessa.

Todo dia eu acordava me perguntando como era possível que eu vivesse com tantos tabus presos em mim. Eram numerosas as coisas que eu nunca tinha oportunidade de fazer e só as via como representação do que se mostrava na televisão. E o que mais me incomodava é que nada tinha hora marcada. A parte do dia que isso vinha nas minhas lembranças era quando eu colocava uma extensa lista do que "podia ter sido" para remoer dentro de mim.
Apagar a luz antes de dormir era só uma forma de sentir na pele que eu era um frustrado, daqueles que só comem o caroço da fruta. Não era um incômodo, nem um escândalo, era só eu. A única atitude que rivalizava com esses tormentos era racionalizar o abstrato, quando esmiuçava o que não tinha profundidade.

Então, houve um dia em que um dos tabus se despedaçou. Eu tinha saído para um local sem pretensão de nada, quando uma janela lá na ponta foi tomada por um feixe de luz convergente. Algo tosco, que eu até tive o desejo de rejeitar, veio à minha mente. Um diálogo tomou conta de mim, sem que eu esperasse que algo fosse acontecer.

Uma quebra foi chegando perto, e tudo parecia o roteiro de um filme inverossímil. Quis desistir do impacto e quase o fiz. Quando estava projetando o mosaico, uma tempestade iniciou a desorganizar os painéis; e tudo foi sendo demolido peça por peça, Nunca um evento tinha sido tão tragicamente decepcionante. Era prenúncio do que seriam anos de lembranças e dezenas de textos sobre frustração.

Ficava remoendo até o osso mais profundo, como se estivesse indo mais longe que o fundo do poço. Era inimaginável. O mosaico continuava a se desfigurar, mas agora voltava à sua função. Renascia muito mais completo, sem ordem nem sequência para ter nexo algum. Agora era um caso de poesia. Eu estava quase no chão, prestes a desmaiar; aí escutei o que ia acontecer. Fechei minha boca, e o mundo explodiu, ressurgindo dentro de alguns segundos. Nada mais era agoniante, não existia mais nada impossível, e eu sentia que não era mais o mesmo homem. Um choque de eternidades havia acontecido, sem possibilidade de ser descrito.


Zeca Lemos