domingo, 29 de novembro de 2015

De noite



Deitado, coloco algumas músicas calmas para tocar para chamar o sono. Realmente, elas me deixam distraído, e aos poucos o baixo suave me traz a vontade de só acordar no dia seguinte. Os pensamentos que geralmente tenho antes de dormir ficam em segundo plano e sinto que um mergulho profundo está próximo.

Fico num mundo distante durante algumas horas, sonhando com o que poderia ter feito naquele dia. Quando um barulho surge, volto ao meu estado consciente. Não há nenhum som ecoando, apenas uma leve impressão de que alguém está passando bem perto da porta do meu quarto. Abro-a, mas nada vejo. Percebo que estou bastante inquieto e resolvo dar uma volta na vizinhança para me acalmar.

Caminho por algumas ruas e, apesar de estar perto de casa, não consigo saber onde estou. Os lugares estão tão vazios que nem sequer os reconheço. Sinto algo diferente, porém não consigo explicá-lo de maneira clara. Estou muito acostumado com locais povoados, abrigando pessoas que dariam certa vida à ocasião que estivessem vivendo. Então, vivo o contraste do que vejo diariamente.

Penso que a cidade é muito mais complexa quando fica escura. De noite, os bairros mostram sua faceta mais profunda; as coisas gritam e expressam sua descrença com o que é vivido toda hora. A falta de espírito das pessoas, a perdição dos jovens, os olhares chorosos de quem não vive o que sonha. Os prédios choram pela intolerância, os cinemas lamentam a falta de gosto pela arte e os bares não resistem à sensibilidade dos indivíduos nem ao que eles remoem.

Enquanto todos dormem para esquecer os fracassos, os locais procuram forças vindas do céu para suportarem a ruindade quando ficar claro. Fico boa parte da madrugada conversando com os cantos e me sinto compartilhar da dor deles. O sol começa a aparecer e vou tomar o café da manhã em uma padaria perto da praia. E não demora muito tempo para que portas e janelas se abram e comecem a fingir que o mundo é um lugar feliz novamente.

Zeca Lemos



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