sábado, 9 de maio de 2015

Choque de mundos



Estava caminhando rumo a uma sorveteria que frequentava esporadicamente. Ficava mais ou menos perto de sua residência, creio que não mais de dez quarteirões. Chegou lá e pediu duas bolas de sabores um tanto exóticos. Escolheu, sentou-se e por alguns minutos deliciou o ambiente que as supostas interpretações das fotografias nas paredes davam ao local.

Depois de uns cinco minutos, seu sorvete chegou. Parecia alguma coisa comum, mas não funcionou bem assim. Quando estava prestes a começar a deliciar-se com o segundo sabor, uma conhecida sua chegou. Inicialmente vinha acompanhada, mas suas amigas inexplicavelmente sumiram após uns minutos. Foi tão rápido que nem deu para ele conjecturar onde elas poderiam ter ido.

A moça ficou sozinha na sorveteria, como se estivesse procurando alguém. Acho que ela nunca havia realmente falado com ele. Pareceu-me que só houve aquele contato de correspondência de olhares que se davam em ocasiões inesperadas, nada mais.

Então, de repente, ela se aproximou da mesa dele, como se estivesse procurando um outro alguém, mas era ele mesmo. Sentou-se numa mesa e começou a conversar. Pelo que lembro, ela falou, argumentou e mal permitiu que ele desse alguma opinião. Só explicou uma situação que ela mesmo tinha chegado problematizando. Ainda começou a falar sobre outra coisa, mas durante essa explicação, sua imagem começou a se enfraquecer como se fosse um holograma movido à energia artificial, perdendo sua carga. O desenho do lugar também ia desaparecendo aos poucos, como se ele estivesse num jogo virtual e o aparelho estivesse sendo desligado.

Parecia que ele estava oscilando entre duas dimensões. Uma delas seria um sonho e a outra a realidade, mas era impossível diferenciá-las. Se ele relatasse isso, ninguém iria acreditar. Parecia um daqueles filmes de ficção adolescente com que algum menino se envolve numa conspiração digital e não consegue mais sair. Para a arte é até um tanto clichê, mas para acontecer no real é sem dúvida fascinante.

Ficou uns dez minutos nessa gangorra doentia estonteante entre os mundos, mas por fim acordou e viu que não tinha passado de um sonho que se travestiu de real. No dia seguinte, numa ida ao colégio, por alguma razão, ela veio falar com ele. Foram cinco minutos que pintaram uma aquarela durante o tempo de olhares. O que ela disse nem fez muito sentido, mas se assemelhou à conversa do sonho.

Nem prestou muita atenção no objetivo das iniciativas, mas se chocou um pouco por ter visto sua mente ser tão profética dentro de menos de um dia. Voltou para casa com os neurônios bem quentes, querendo compreender o que aquele movimento simbolizava. Os significados eram tão múltiplos que qualquer análise seria insuficiente. Apenas constatou que os mundos que habitava no fundo eram iguais. No fim, o sonho é real e a realidade é sonhada mesmo

Zeca Lemos




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